Os desafios e oportunidades da regulação do mercado de carbono no Brasil nortearam os debates na audiência pública realizada nesta segunda-feira, 20, na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF). O secretário do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Tocantins, Marcello Lelis, foi um dos convidados para contribuir e, na ocasião, apresentou os passos para a construção do Programa Jurisdicional de REDD+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) do Tocantins e o atual momento do processo conduzido pelo Estado. O presidente da Tocantins Parcerias, Aleandro Lacerda, também acompanhou a audiência.
A autora do requerimento que resultou na audiência, deputada federal Socorro Neri (PP/AC), destacou que as políticas de enfrentamento da crise climática precisam estar alinhadas às metas nacionais de redução de emissões e com o desenvolvimento econômico sustentável. A participação do secretário Marcello Lelis na audiência foi requerida também pelo deputado federal Ricardo Ayres (Republicanos/TO), que acompanhou a reunião de forma virtual.
Em sua apresentação, o gestor da Semarh elencou vantagens do modelo Jurisdicional de REDD+, entre elas a segurança jurídica. Lelis apresentou a linha do tempo do arcabouço legal que o Governo do Tocantins construiu desde 2008, com a implementação da Política Estadual de Mudanças Climáticas (Lei Nº 1.917/08), passando pela elaboração do Plano de Prevenção e Combate aos Desmatamentos e Incêndios Florestais – PPCDIF, em 2020, além de etapas importantes como a elegibilidade, perante à Comissão Nacional para REDD+ (CONAREDD+), para acessar recursos financeiros de REDD+ na modalidade pagamento por resultados nos biomas Amazônia e Cerrado.
“Recentemente criamos a lei [Nº 4.131/23] do Fundo Clima e é importante ressaltar a governança que ela estabelece. O Comitê Gestor, responsável por gerir os recursos, é formado pelo governo, sociedade civil e iniciativa privada, além de ser acompanhado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente [Coema] e pelo Fórum Estadual de Mudanças Climáticas [FEMC]. Além disso, essa lei direciona os investimentos, ou seja, tudo será aplicado de acordo com as salvaguardas de Cancun e os eixos da Estratégia Tocantins Competitivo e Sustentável”, explicou.
O aninhamento de projetos privados no REDD+ Jurisdicional, um dos assuntos citados na audiência, também já está previsto em outra legislação do Tocantins, a Lei Nº 4.111/2023, que instituiu a Política Estadual de Pagamento por Serviços Ambientais. “O cenário ideal para os estados amazônicos como o Tocantins é constituído pela combinação de programas jurisdicionais e projetos privados. A Lei deixa claro, os projetos privados que se apresentarem à Semarh, com garantia do cumprimento das salvaguardas e utilização de metodologia compatível, serão aninhados”, disse. Em outras palavras, o desenvolvimento de um modelo jurisdicional não impede a realização de projetos privados, cujas reduções de emissões podem ser incorporadas desde que respeitados os critérios mencionados.
A jornada que o Tocantins tem pela frente para a construção das salvaguardas também foi lembrada pelo gestor. “O REDD+ Jurisdicional é a forma mais eficiente, mais sólida, por ser um projeto de Estado, de garantir que os recursos cheguem aos povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares”, afirmou o secretário, destacando ainda que “o agro também foi convidado para se sentar à mesa e discutir junto conosco não apenas formas de enfrentamento do desmatamento ilegal, mas também como a gente pode aumentar a produtividade em menores áreas”.
Para o presidente da Tocantins Parcerias, Aleandro Lacerda, participar da audiência foi de extrema importância para ouvir e entender visões diferentes de agentes que estão inseridos no programa de REDD+ em todo o país. "Foi unânime a importância do projeto jurisdicional por todos, e a união dos atores privados e públicos: a indústria, os pequenos e grandes agricultores rurais, povos originários e quilombolas, para avançar nas políticas de combate a mudanças climáticas", contou o presidente, que trabalhou na elaboração do arranjo jurídico do Programa Jurisdicional de REDD+ do Tocantins.
Carbono jurisdicional
O diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia - IPAM, André Guimarães, defendeu o carbono jurisdicional como equação capaz de tornar o combate local às mudanças climáticas mais eficiente. “Nós defendemos um mercado que se submeta à lógica jurisdicional, seja ele voluntário ou regulado, e que seja contabilizado. Temos que saber o que acontece nos territórios, afinal foram os territórios que assumiram compromissos de redução no Acordo de Paris. A solução para tornar esses mercados justos, eficazes e transparentes, é a união em torno de uma contabilidade única para sabermos qual a contribuição do Brasil, afinal, o objetivo principal é mitigar as mudanças climáticas e auxiliar os países em desenvolvimento a se adaptarem aos seus efeitos”, pontuou.
O trabalho intenso dos técnicos do governo federal para gerar um texto propondo uma regulamentação para o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), foi comentado pelo diretor do Departamento de Política de Mitigação, Adaptação e Instrumentos de Implementação do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Aloísio Lopes. “O sistema regulado pretende colocar para nossa política de clima um instrumento que de fato gere uma sinalização pros agentes econômicos de que é melhor investir em tecnologias menos intensivas de carbono, principalmente os grandes emissores, com isso gerar uma dinâmica positiva de investimento e inovação, e por outro lado gerar uma demanda estável por créditos de carbono”, disse.
Projetos de Lei
O projeto de Lei (PL 412/2022) que regulamenta o mercado de carbono no Brasil foi aprovado no início de outubro na Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal. Com a aprovação unânime e terminativa, o projeto seguiu para a Câmara dos Deputados, sem passar pelo plenário do Senado. Além deste, outro projeto de Lei (PL 2148/15), que cria incentivos para a economia de baixo carbono, também tramita na Câmara dos Deputados. A tramitação destas pautas é um dos principais motivos da realização da audiência, que faz parte de uma série de encontros que têm sido realizados pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara.